Pra variar um pouco a programação do final de semana, o síndico do prédio onde eu me escondo marcou uma maravilhosa reunião de condomínio para um sábado à tarde. Como sempre, eu fui. Às vezes tenho que parar de ser menos fanático por este tipo de coisa, enfim, eu estava lá, juntamente com mais oito pessoas; formando um total de nove condôminos. Só por curiosidade, o condomínio onde eu resido tem 190 pessoas. É sempre bom ver que há um interesse por coisas que interessam a todos, ou não.
Mas lá estávamos nós, nove corajosos ouvintes, num sábado a tarde, no horário do cachorro quente do mercado grande que existe perto do lugar onde moramos. A reunião ia bem, sem muitas discussões, quando o síndico resolveu ler um ítem do regulamento interno:
''Os apartamentos devem ser usados exclusivamente para domicílio, e não para fins comerciais.''
Era só isso, uma simples linha, lida em menos de dez segundos; mas... E o pior é sempre isso, sempre existe um mas no meio do caminho... Um dos presentes levantou a mão, e num tom estranho, disse um monte de coisas em língua estranha.
''_ Eu gostaria de saber se para este sufixo há uma possibilidade de uma não instauração de um home office? Por que eu tenho um home office na minha casa.''
Sem entender nada, o síndico olhou para os olhos dele, e já arrependido do que tinha lido, disse:
''_ Domicílio, quer dizer pra morar; é pra você morar na sua casa.''
Confesso que fiquei mais tranquilo com este tipo de informação, mas enfim, o morador insistiu no termo que estava usando, como se o síndico tivesse a obrigação de saber o que ele fazia dentro das paredes da casa dele.
''_ Estou perguntando de um home office, é possível ter um home office, ou até isso você vai tirar da gente?''
''_ Não estou entendendo você.''_ disse o síndico.
''_ Um home office, até quantas pessoas podem frequentar um espaço de um home office, dentro de um espaço destinado para um trabalho de office?''_ o homem estava se complicando cada vez mais em suas colocações.
''_ É domicílio! É pra morar eu tô dizendo, é pra morar! Você não quer morar na sua casa?''_ o síndico estava começando a ficar nervoso com tudo aquilo.
''_ Eu tenho um home office; por que não posso ter um home office na minha casa?''_ resmungava o morador.
Eu estava quase levantando pra ir embora daquele lugar, quando uma moradora, fazendo crochê, acomodada num banco atrás de onde eu estava, levantou a mão e disse para o síndico:
''_ É um trabalho em casa isso que ele tá dizendo. Ele tem um escritório na casa dele, mais nada. Ele não vai vender nada lá... Ou vai?''_ olhou pra ele.
Sem ter pra onde correr, o homem levantou e disse:
''_ Nâo é pra vender, é só um home office.''
No mesmo instante a mulher parou com seu crochê, e isso deve ter sido horrível pra ela fazer, por que ficou muito brava, levantou também, e disse em alto tom:
''_ Pára com essa merda de office, fala nossa língua, é um escritório dentro da sua casa, todo mundo aqui sabe o que é ter um escritório em casa, pára de ficar inventando moda.''_ a mulher sentou novamente e apontou para o síndico. ''_ Pode continuar agora.''
O homem ainda em pé, disse:
''_ Eu não vou mais ficar aqui na reunião por que eu tenho um compromisso agora as ''cinco'' horas da tarde, no meu home office.''
''_ Vai embora daqui, e leva o seu home office junto.''_ gritou a mulher.
Climão, realmente ficou um climão. Por fim, o homem saiu, e tudo transcorreu sem maiores problemas até o fim da discussão. Ás vezes fico pensando como é bom ter gente assim no nosso mundo, os tontos, que insistem em querer demonstrar conhecimento numa coisa tão banal e idiota como uma simples expressão estrangeira; e os de paciência curta, que não toleram estes tontos e fazem valer o bem estar de todos através dos gritos. Aquela situação estava realmente me deixando irritado, de tanto ouvir o cara querer se fazer entender sem explicar o que ele queria dizer, mas quando a mulher levantou a voz e eles quase se pegaram no tapa, fiquei com um pouco de medo da mulher, pois se ela faz valer sua impaciência como uma forma de acelerar o problema que estava acontecendo, assim ela também pode gritar mais alto para fazer valer suas decisões quando ela não concordar com uma outra opinião, tipo a minha. E foi o que aconteceu. Num avançado ponto da reunião eu opinei sobre algo, mas ela não concordou, e quis gritar mais alto. Eu temia que isso ia acontecer, e aconteceu. Por minha sorte naquele instante, minha opinião estava interligada com a opinião do síndico, e isso fez eu ganhar a causa; para desespero da mulher.
Não é querer dizer que eu estava certo ou coisa e tal, é querer entender o que leva alguém achar que tudo pode ser ganho no grito... Enfim, não é gritando que você ganha algo na vida... Com exceção dos animadores de auditório de televisão e dos técnicos de futebol.
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