''Quando acertamos ninguém se lembra, quando erramos ninguém se esquece''

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

O CONE - capítulo 5

Enquanto dormia, o homem conseguiu ouvir lá no fundo de seus tímpanos um leve som, que vinha do mundo exterior. Despertando do sono que lhe tomava conta da alma, Bruno levantou lentamente. Colocou suas pantufas do pateta e caminhou até a porta de entrada de sua casa. A campainha estava sendo pressionada por um conhecido. Ao vê-lo, Bruno abriu a porta.

_ Bom dia._ disse com cordialidade.

_ Por que bom dia, você conhece este menino?_ gritou o vizinho enfurecido.

Bruno olhou para o rapaz e o reconheceu como o ladrão do dia anterior.

_ Sim, é o ladrão. Onde o encontrou?

_ Ladrão é sua avó, ele é meu filho, seu animal._ berrou o homem.

_ Seu filho virou ladrão agora. Que decadência. Por que não foi trabalhar na empresa do avô?_ Bruno tentou argumentar.

_ Você não vale nada. Eu vou processar você por ter agredido meu filho, seu bandido._ apontava o vizinho para o rosto de Bruno.

_ Ele entrou na minha casa. É propriedade privada. Eu não tenho nada a temer. Pode processar, mas vai perder o processo.

Diante de tal impasse, devido à firmeza que Bruno respondeu a acusação, o pai indagou o filho:

_ Você invadiu a casa dele?

_ A gente estava jogando bola na rua, time de camisa contra os sem camisa, a bola caiu no quintal dele, eu pulei pra pegar. Quando estava com a bola na mão, ele me jogou um martelo na panturrilha.

_ Era um martelo de carne, que fique bem entendido._ disse Bruno.

_ Isto não vai ficar assim, você vai pra cadeia seu animal._ repetiu o homem.

_ Ele invadiu minha casa, não posso fazer nada. O que posso fazer é lhe processar duas vezes, uma por invasão de domicílio e outra por usar palavras de baixo calão contra a minha pessoa._ respondeu Bruno.

Pai e filho foram embora, Bruno fechou a porta de sua casa e voltou para a cama. Acomodou-se em sua cama, ajeitou a coberta sobre seu corpo e quando estava quase pegando no sono, ouviu novamente um leve barulho no fundo de sua mais longínqua audição. Levantou com lentidão e caminhou até a porta de entrada de sua casa. Enquanto andava lentamente, pensou:

‘’vizinho idiota, o filho dele se passa por ladrão e a culpa é minha? Se têm alguém que deve ser preso é ele, por invasão domiciliar. Quer chamar a polícia, chame a polícia então, vamos ver, vamos ver o que ele tem a me dizer neste momento’’. Ao abrir a porta deparou-se com dois policiais, fardados, em pé, na frente dele.

_ Pois não._ a voz até afinou ao pronunciar o cumprimento.

_ O senhor se chama Bruno?

_ Sim._ respondeu o homem esticando a mão lentamente na direção dos guardas, somente esperando as algemas serem colocadas.

_ O senhor ligou para o distrito pedindo uma viatura, devido a uma invasão de domicilio, é daqui mesmo, confere esta informação?

_ Confere, mas isto foi ontem.

_ O acúmulo de serviços dificultou um pouco o nosso trânsito e nos atrasou alguns minutos._ explicou o homem fardado.

_ 24 horas de atraso. Vocês chamam 24 de atraso de alguns minutos? Nada mal para a eficiência da polícia._ debochou Bruno.

_ Então parece que não tem ladrão nenhum. O senhor quer registrar um boletim de ocorrências a respeito do que fora roubado?

_ Não, não foi roubado nada. Eu tive de jogar um martelo no ladrão, por que vocês não estavam aqui. E hoje o pai do ladrão veio até aqui tomar satisfação por isso._ Bruno começou a se exaltar.

_ Você conhece o pai do ladrão?_ perguntou.

_ Conheço, ele é meu vizinho. O ladrão disse que estava jogando bola, mas o pai do ladrão disse que vai me processar por isso._ tentou explicar.

_ Espere aí um momento. O pai do ladrão estava jogando bola e quer te processar pelo filho dele ser um ladrão?

_ Não. Na verdade... Nada disso tem sentido. Bom trabalho pra vocês. Desculpe incomodá-los._ despediu-se dos homens fardados.

_ Tudo bem então, vamos embora. Só peço que não fique aplicando golpes falsos no distrito, isto pode acarretar problemas para o senhor.

_ Sim seu guarda, da próxima vez eu vou jogar o martelo na sua cabeça._ disse Bruno.

O policial interrompeu sua caminhada, olhou para ele e disse:

_ Eu posso prendê-lo por desacato a autoridade.

_ E eu posso te processar por omissão de socorro._ disse o homem.

_ Nós não omitimos nada._ gritou o homem fardado.

_ Omitiram. Eu tenho o número do protocolo da ligação. Liguei ontem, vocês vieram hoje. E se eu estivesse morto? Quem iria responder por isso? Ninguém! Sabe por quê? Porque não interessa pra vocês se morre um ou nenhum, é tudo a mesma coisa.

_ Vou prendê-lo por desacato._ o policial anda na direção dele.

_ Toque um dedo em mim, dentro da minha propriedade, sem um mandato judicial que eu faço você perder seu emprego.

O outro homem vestindo farda o encara, e pergunta:

_ Você é advogado?

_ Sou, sim senhor._ responde Bruno.

Os dois homens se olham e dizem:

_ Vamos embora daqui. Não vale a pena estressar com este tipo de gente.

_ Não vale a pena é brigar com alguém que conhece seus direitos e deveres dentro da lei. Isto é o que é. Podem ir, briguem com quem não conhece os próprios direitos, é mais fácil de controlar desta forma.

Os homens vão embora e Bruno volta a dormir.

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