Ao abrir o jornal nesta terça feira deparei-me com uma notícia um tanto quanto estranha, roubo de alimentos nas escolas. Incrível! Já não basta a quantidade pouca de comida que chegam até os colégios, agora, estão roubando até esta comida que conseguiu chegar ao colégio? É o fim dos ladrões de equipamentos, a coisa está tão complicada que estão roubando comida... Bem, devo corrigir esta última frase, na verdade não estão roubando comida, estão apenas entrando nas escolas, arrombando as portas dos depósitos de merenda e estragando toda esta comida. Caso a notícia fosse outra, estão roubando pra comer, poderíamos pensar em ações divinas contra esta raiva momentânea que pode surgir num leitor comprometido com o país; estão roubando por que não tem o que comer, então estão consumindo coisas que fará bem a saúde de alguém; que bom se fosse assim. O que está acontecendo é um descaso do ser humano para com crianças que não tem nada a ver com o fracasso alheio. Entrar numa escola, estragar a comida que seus filhos, um parente próximo, ou quem sabe um conhecido faminto, iria consumir em uma, duas, ou três refeições, é mais do que um ato mutante, citei tal palavra para não ofender diretamente os animais.
Na cidade de Campos, no Estado do Rio de Janeiro, uma escola foi arrombada no dia 10 de setembro de 2009; motivo: roubo de comida. A Escola Municipal Carlos Chagas teve suas portas e janelas arrombadas pelos bandidos que entraram para saquear alimentos. Da escola foram roubados 187Kg de arroz, 103 Kg de feijão, 79 Kg de macarrão, 35 Kg de carne seca, um botijão de gás, uma bomba de água e um aparelho de som. Nada restou na dispensa para os cerca de 280 alunos da escola. A diretora da escola, que não quis se identificar, disse que a unidade não possui vigia, por isso não tem muita segurança. (fonte: ururau.com.br - 29/09/2009)
Outra escola, desta vez no município de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, no Estado do Paraná, teve seus cadeados arrombados por ladrões. A escola já vem sendo assaltadas por um certo tempo, acumulando em sua trágica recente história, 24 roubos, somente no ano de 2009. De acordo com o jornal paranaense, os ladrões já levaram desde alimentos usados na merenda escolar até os computadores da escola. Logo depois que os primeiros roubos aconteceram, a direção do colégio decidiu guardar os alimentos dentro da sala de informática. A medida de segurança, porém, não resolveu o problema. Os bandidos quebraram os vidros da sala e pegaram os produtos. “Eles pegam um ferro, dobram, fazem um gancho e puxam pelo vidro os alimentos que estão dentro da sala”, contou Celso Rosa, pai de um aluno que estuda no colégio.
Da última vez que ali entraram os marginais, as ferramentas improvisadas para o roubo ficaram jogadas no pátio da escola. Os bandidos levaram biscoitos, sopas e o arroz da merenda dos estudantes. Na lista do que foi roubado ainda estão computadores, televisores, produtos de limpeza, panelas, uma máquina de lavar roupas, as torneiras e até o álcool gel. Os bandidos não deixaram nem o material de construção que estava sendo usado na reforma da escola. Só o bebedouro se salvou. Ele ainda está no pátio porque foi preso à parede. (fonte: Gazeta do Povo - 29/09/2009)
Em Campo Magro, outra cidade da região metropolitana de Curitiba, policiais da Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos (DFRV) localizaram caminhões roubados e cinco toneladas de merenda escolar, distribuída pela Secretaria da Educação. O material estava armazenado em um barracão na cidade de Campo Magro. A carga foi identificada pelos rótulos nos produtos, com logotipo da Secretaria da Educação e com aviso de venda proibida. Segundo boletim de ocorrência, em 3 de julho, ladrões atacaram o caminhão de uma transportadora, carregado com cerca de cinco toneladas de produtos da merenda escolar. O destino dos alimentos era as escolas estaduais de Colombo, também na região metropolitana.(fonte: O Diário on line - 29/09/2009)
Para tanto, o que deve ser feito quando isso acontece? Primeiro reforçar a segurança, e há meios legais para que isso aconteça. Em relação ao material roubado, no caso mais específico dos alimentos, a Secretaria Municipal do Estado de São Paulo apresenta um dos caminhos. Em caso de roubo ou furto de alimentos a unidade escolar que foi invadida e saqueada deverá providenciar o Boletim de Ocorrência (B.O.), relacionando com detalhes os alimentos e as quantidades roubadas e/ou furtadas. Deve-se registrar a ocorrência junto a SME/DME, anexando no mesmo documento um Memorando Padrão à SME/DME, no qual deve relacionar os alimentos e as quantidades roubadas e/ou furtadas, não esquecendo de informar a necessidade ou não de reposição. O Boletim de Ocorrência (B.O.) deve discriminar todos os alimentos roubados e a quantidade de cada produto que foi roubada. A nota ainda deixa bem claro que somente será feita a reposição nas quantidades igual ou inferior dos alimentos que estiverem relacionados no B.O., nada mais além disso.(fonte: Portal da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo)
Em artigo publicado na folha on line de 29 de abril de 2004, Luciana Constantino, cita o relatório preliminar da Unesco, ''Vitimização nas escolas'', onde a escola pública brasileira, que deveria ser um lugar de inclusão e convivência de diversidades, tem se transformado cada vez mais em um ambiente onde o aluno se sente vulnerável e inseguro. O presente relatório cita ainda que entre os alunos entrevistados na rede pública de cinco capitais e do Distrito Federal, 83,4% disseram existir violência em sua escola. O roubo é o tipo mais freqüente, citado por 69,4% dos estudantes. Dos que já foram roubados na escola, 37,1% responderam ter sido vítima uma ou mais vezes no último ano. Um dado preocupante: 4,8% dos entrevistados assumem já ter participado de algum roubo na escola.
"O roubo se tornou algo secundário, normal. Foi completamente banalizado. Muitas vezes os alunos reclamam, mas não têm resposta de diretores ou professores. Isso faz com que se sintam vulneráveis", afirma a socióloga Miriam Abramovay, coordenadora da pesquisa.(fonte: Folha On Line - 24/04/2004)
Além do roubo estar sendo tratado como coisa banal dentro de uma instituição escolar nos perfis atuais, a pesquisa aponta que o roubo pode ser um ato de exibicionismo ou de tentar obter aquilo que o aluno não tem. "Roubaram muita coisa na minha sala. Este ano, já perdi dois estojos cheios de lapiseira, caneta, lápis de cor. Mas tem que tomar cuidado. Dessas coisas pequenas, daqui a pouco estão roubando dinheiro", diz o depoimento de um aluno do ensino fundamental no Distrito Federal.
Ou quem sabe, merenda. Talvez o roubo da alimentação não seja por necessidade de venda, troca ou fome, mas sim um ato de poder dentro do grupo. A Unesco, durante a realização deste trabalho, aplicou questionários a 12.312 alunos e 2.395 adultos (professores, diretores e funcionários) em 143 escolas da rede pública das cidades de Belém, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Distrito Federal. A amostra foi expandida, por isso os dados correspondem, segundo a Unesco, a 2,115 milhões de estudantes do ensino fundamental e médio.
Assim como num grupo de pichadores, onde o mais alto ponto a ser pintado com letras indecifráveis para meros normais não pertencentes ao bando, é o maior grau de respeito alcançado pelo realizador, invadir uma escola e espalhar merenda pelo pátio, também pode ser.
Em notícia publicada em agosto de 2004 um colégio estadual de Sergipe expôs este problema: ''Desde segunda-feira, 16, as aulas do Colégio Estadual Professor Hamilton Alves Rocha, localizado no conjunto Eduardo Gomes, em São Cristóvão, Aracaju - Sergipe, estão com as aulas paralisadas. A decisão foi motivada após dois arrombamentos ocorridos na unidade de ensino durante este fim de semana. No primeiro, ocorrido no sábado, 14, os invasores aproveitaram a falta de vigilância e levaram da dispensa do colégio um botijão de gás e parte da merenda das crianças. No dia seguinte, os funcionários encontraram a janela da cantina aberta e a merenda espalhada pelo pátio. Mesmo tendo consertado a porta, o local foi arrombado novamente, entre o domingo para a segunda-feira. Desta vez, as paredes, as geladeiras e o freezer foram pichados. A 6ª Delegacia Metropolitana foi informada do ocorrido e realizou buscas no local. Foram encontradas panelas, além de um liquidificador e o botijão de gás, escondidos num matagal nas imediações da escola. Segundo os funcionários, o mato alto que circunda o colégio facilita a ação dos assaltantes''. (Jornal da Cidade-SE, p. Capa e p. Cidades B5 – 17/08/04)
Coinscidência ou não, pichação e merenda no pátio é uma forma de ser notícia, pelo menos dentro do grupo que estes mutantes pertencem; cito novamente a palavra mutante para não ofender os animais. O relatório da Unesco ainda cita a questão da entrada de armas nas escolas, segundo a pesquisa a arma mais comum no ambiente escolar é o canivete: 21,7% disseram já ter visto um. Outros 12,1% disseram ter visto revólver na escola e 13%, faca.
"A minha colega entrou com uma faca de mesa. Porque a moleca de outra gangue queria agarrar ela, queria furar ela e ela trouxe uma faca", diz o relato de uma aluna do ensino fundamental de Belém.(fonte: Folha On Line - 24/04/2004)
Para Abramovay, a escola precisa se tornar um local de diálogo com o objetivo de tentar reverter o quadro de violência que tem sido registrado. "Na escola tem funcionado a lei do silêncio, em que os alunos fingem que nada está acontecendo, os diretores ignoram e os professores também não falam, muitas vezes até por medo de represália. Com isso, a escola se torna um lugar desprotegido, que não consegue passar valores mínimos", diz a pesquisadora.
Apesar dessa visão crítica, 49,2% dos alunos consideram sua escola boa ou ótima. Outros 43,1% disseram que seu colégio é "mais ou menos". Agora, se não tem merenda, aí ela se torna péssima.
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