Bruno acorda e senta na cama. Olha para os lados e imagina coisas a respeito de um futuro que ainda não conhece. Idealiza num rápido instante algo magistral para sua vida em preto e branco. Não consegue contar nada a ninguém. A única amiga que tem neste momento é uma caveira, reduzida a um crânio de plástico, colocada em um dos cantos do quarto onde dorme. Sem demora levanta do lugar onde está e caminha até o objeto. Recolhe-o do chão e abraça com carinho.
_ O que você estava fazendo ali, sozinha?_ pergunta para o crânio.
A porta abre lentamente sem que ele perceba. Os passos não são ouvidos. Alguém entra em sua casa e caminha com lentidão na direção do lugar onde ele está.
_ Bom dia._ diz uma voz feminina.
Surpreso com o cumprimento de bom dia o homem assusta-se, lançando-se na cama que acabara de abandonar.
_ O que houve papai assustou-se?
_ Claro que sim._ responde.
_ Não acredito! O que está fazendo com este crânio nos braços novamente?
_ É minha amiga._ diz com a voz trêmula.
_ Não é sua amiga papai, é uma paixão antiga, mas não pode ficar falando com ela._ explica a mulher.
_ Por que não posso?
_ Papai..._ a mulher senta na cama ao lado dele._ Eu já lhe disse. O senhor sempre sonhou em ser médico, mas não é médico. Nunca será um médico. Quando a vovó comprou esta caveira ela esperava que o senhor se inspirasse e estudasse para ser um médico. Era o sonho da vovó vê-lo se transformar num médico, mas o senhor não seguiu este sonho. Então deve parar de ficar andando com esta caveira embaixo do braço.
_ Ela é minha amiga. E não é uma caveira, é um crânio._ corrige-a.
_ Tudo bem papai, é um crânio, mas não pode ficar conversando com um crânio de plástico.
_ Onde está minha mãe?_ pergunta o homem.
_ Ela faleceu há alguns anos. A vovó morreu com 102 anos. Não se lembra?
_ Ela não pode ter morrido, eu não sou um médico ainda._ diz com a voz embargada.
_ Eu sei papai, eu sei._ a filha o abraça.
O homem chora compulsivamente.
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